30.5.02

Não é à toa

É cada vez mais árdua a tarefa de fazer análises da economia brasileira nos últimos anos. Frente ao fundamentalismo dos economistas do governo e à rigidez com que se apegam à cartilha da ortodoxia econômica, pode chover canivete, ter apagão ou epidemia de dengue, que a rapaziada não abre mão do manual de boas maneiras do mercado financeiro. A quem compete comentar a conjuntura econômica é necessária muita imaginação para dar conta da toada hipnótica de Malan e seus comparsas. Até mesmo analistas consagrados como Paulo Nogueira Batista Jr., Delfim Neto ou Luiz G. Belluzzo, têm, cada qual à sua maneira, repetido as mesmas críticas que já faziam há vários anos atrás.

Ocorre que, assim como aconteceu na Argentina, já há oito anos a equipe econômica capitaneada por FHC vêm insistindo na mesma receita e, apesar das evidentes mazelas que tem provocado, não parece disposta a largar o osso. Curiosamente, a própria candidatura governista não tem resistido a tamanha teimosia, afundando a cada nova má notícia que aflora neste fim de mandato tucano, a despeito de este ser um ano eleitoral de um governo que teve sete anos para arrumar a casa.

E a mais recente péssima notícia foi o recorde de desemprego na região metropolitana de São Paulo. Segundo o Dieese, o número de pessoas desempregadas chegou a 1,904 milhões em abril último. Ou seja, 20.4% da população economicamente ativa (pessoas aptas e com interesse em trabalhar) esteve procurando - em vão - um emprego na região de São Paulo. Nunca a pesquisa do Dieese tinha apontado para um desemprego tão elevado, nem mesmo nos piores momentos dos governos Sarney e Collor.

Dois milhões de desempregados é muita gente, e não é a toa que a vida fique insuportável em uma cidade na qual 1 em cada 5 trabalhadores está desocupado e onde, entre os outros 4 que possuem emprego, apenas 2 têm carteira assinada. Não é à toa que a violência tome conta das ruas, não é à toa que os jovens caiam no crack ou que os pais se tornem alcoólatras.

E antes fosse este um problema localizado em São Paulo. Em todas as regiões metropolitanas pesquisadas pelo Dieese o desemprego vem crescendo e atingindo marcas inéditas. A taxa de desemprego de Porto Alegre, a menor entre as pesquisadas, já supera 15% da população economicamente ativa.

Mas, como eu disse, não é à toa. Aliás, no mundo econômico muito pouca coisa é fruto do acaso, e a grande dificuldade é justamente dar conta de entender as múltiplas inter-relações entre as variáveis econômicas. O que determina o que e com que intensidade?

Há cerca de 20 dias, o IBGE divulgou que a renda do trabalhador brasileiro caiu 25% desde o início do Plano Real. Há uma semana informou que o PIB caiu 0,7% no primeiro trimestre de 2002, que a produção industrial caiu 1,84% enquanto a construção civil despencou 8,9%. E também há uma semana, o Banco Central decidiu que manterá a taxa de juros básica da economia em 18,5% ao ano (a segunda maior taxa entre os países emergentes).

O que será então que determina o que?

Perdoe-me, caro leitor, mas torna-se impossível não ser repetitivo quando o assunto é a atual política econômica do Brasil.

Marcelo Manzano
[ publicado no Diário do Litoral - 30/05/2002 ]

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